Nota do blog: todas as narrativas e opiniões neste post são dadas com base na vivência da autora do blog. Cada um de nós é um ser único, as experiências e impressões são diferentes para cada um de nós ❤
Li em uma reportagem por esses dias: a mulher que amamenta só deve tomar qualquer remédio depois de conversar com um médico. Óbvio e ululante, concordas? Se isso cá fosse um teste de certo e errado, numa análise mais do que justa, não haveria ninguém a apontar qualquer contrariedade ou indício capaz de desabonar tal afirmativa.
Todos nós deveríamos tomar remédios apenas sob indicação médica, claro. No caso das lactantes ainda mais, já que diversos medicamentos são transferidos da mãe ao filho pelo leite materno e podem apresentar riscos para bebês e crianças. Acontece que, na prática, o buraco (como sempre) é mais embaixo. Assim, quero lançar-vos aqui uma, digamos “distopia”:
E se, num mundo paralelo, passado nos mesmos dias de hoje, os médicos, a quem devêssemos consultar, não estivessem preparados, em grande volume de profissionais, para orientar a mulher que amamenta sobre quais remédios tomar ou não?
A notícia desoladora é que essa “distopia” é a nossa realidade. E isso acontece aqui, no Brasil (pelo menos), agora e o tempo todo.
O Data-Escreve-se apurou
Somente no último mês, precisei visitar sete médicos. Nada grave. Fui a consultas e exames de rotina. Detectei um recém-adquirido hipotireoidismo e, por isso, fui a um endocrinologista. Uma crise no túnel do carpo me levou a especialistas e emergências em busca de “drogas [lícitas] que curam e acalmam” rs.
Dos sete especialistas com os quais me consultei recentemente, para cinco deles, precisei apresentar o site e-lactancia, referência na busca por medicamentos compatíveis com a amamentação e ferramenta fundamental a profissionais de saúde, puericultura e pessoas de todo mundo.
Sempre digo em consultas médicas (essas situações recém-acontecidas não são únicas na minha história. Houve outras mais no passado e sei que a desinformação médica sobre amamentação me espera em futuras consultas):
— Eu amamento, então, temos que ter atenção com os medicamentos, OK?
“Ah, você teve filho recentemente…” – o médico costuma dizer. Eu respondo:
— Não, tem quase três anos…
É divertido observar a expressão de horror de alguns médicos com a minha afirmativa rs. Uns, me parabenizam, outros, ironizam, outros, ainda, tentam a todo custo me dissuadir do ato realmente perigoso de amamentar (ora, veja bem, me dissuadir do meu corpo, minhas regras).
Semelhante momento de tensão acontece quando eu digo: — Você pode checar se esse medicamento é compatível com a amamentação no e-lactancia? – confesso que eu já faço com uma pontinha de provocação, ansiosa em descobrir se o médico vai saber o que é.
A cara dos médicos é quase sempre a mesma: “oi? e-lactancia?”.
Aí, vou eu lá mostrar para eles a “invenção da roda”. Mermão, como assim você não conhece um site famoso por indicar o que é seguro ou não para a lactante? Por ventura, você não atende mulheres?
Os (tristes) exemplos seguem…
Na ultrassonografia de rotina que fiz este mês, informei à médica que ainda amamentava. Não lembrava se isso influenciava de alguma forma nas imagens que ela faria nas mamas. No que ela me respondeu: “Tá na hora já de parar, hein!”.
Em outro consultório, quando pedi um remédio mais forte para dar conta da minha crise do túnel carpo, uma médica, a quem eu já houvera apresentado o e-lactancia, me disse: “Ah, mas você amamenta. Não pode tomar nada mais forte. Toma dipirona.”
Acontece que eu posso, sim, tomar medicamentos mais fortes. Há medicamentos eficientes e compatíveis com a amamentação. Rola uma certa preguiça de alguns profissionais, pelo menos às vezes é o que parece, em pesquisar outras opções. E, mais, nesse caso, senti até uma certa punição naquela frase por eu optar por fazer amamentação prolongada com um filho de quase três anos.
Nem vou listar aqui a infinidade de pesquisas e estudos que provam a importância da amamentação exclusiva até os seis meses e por, pelo menos, até os dois anos em paralelo à alimentação regular, né?

Se você ainda está sob o jugo do desconhecimento, dá um Google aí, e sua vida nunca mais será a mesma com o tanto de informação e recomendação sobre a amamentação.
Apenas a ponta do iceberg (depois de escrever esta frase, pensei no trocadilho infame: apenas a ponta do mamilo hahahah):
O despreparo médico corriqueiro para atender mulheres que amamentam é apenas reflexo de outras questões graves da sociedade contemporânea em relação à amamentação e maternidade:
– A média de tempo que bebês e crianças são amamentados no Brasil é baixíssima. Logo, é raro mesmo médicos receberem mulheres que amamentam de maneira prolongada. Mas isso não é desculpa, ainda acho uma forma de descaso velado de um profissional que deveria ter mais atenção à amamentação e às mulheres!
– Há o culto à fórmula: patrocinado pela indústria e reproduzido por médicos, profissionais de saúde, mídia e familiares que, muitas vezes, ficam ansiosos e pressionam as mães pela introdução do leite artificial como solução nutricional IDÊNTICA AO leite (mentira) e mais cômoda.
– O tabu relacionado à amamentação, que sexualiza o ato de puro amor e ternura entre mãe e filho, a ponto de sugerir que mães amamentem escondidas ou se cubram. Se a criança já andar, falar e tiver a boca cheia de dentes, maior ainda é o preconceito.
– A romantização da amamentação (da maternidade como um todo, na real). A publicidade mostra mães lindas e celestiais amamentando. Mas amamentação envolve além de leite, sangue e lágrimas. No início, principalmente, é “tiro, porrada e bomba”. Não é fácil, mas possível, na maioria dos casos, quando a mulher tem o desejo de seguir, conta com informação e rede amorosa de apoio (há casos físicos ou pessoais que impedem a amamentação e tá tudo bem. A mulher deve ter o direito de escolher o que lhe convém. E não ser julgada quando fatores adversos levarem ao uso da fórmula que, inclusive, salva vidas, mas não precisa ter o uso banalizado).
A foto desta postagem como prova!
A foto desta postagem é uma ironia e um protesto (e fofura, porque o macaquinho é fofo e opressor, neste contexto aqui, ao mesmo tempo rs). Na minha busca por uma foto de uso gratuito em bancos de imagem, não encontrei fotos, entre as já poucas disponíveis, que mostrassem uma mãe amamentando toddlers, porém, somente bebês. Ou seja, mães e filhos que praticam amamentação prolongada não são representados, simplesmente porque se convencionou que amamentação é coisa de recém-nascido (quando, não, dispensável).
Em uma segunda perspectiva, achei diversas fotos de bichinhos sendo amamentados. Fofo? É, mas opressor, já que mostra como nós humanos queremos deixar a amamentação bem escondidinha na nossa versão animalesca (e não animal, veja bem). Podia ter procurado mais? Poderia, mas achei bem conveniente escolher a foto do macaquinho por ser uma maneira de falarmos sobre como optamos por associar a amamentação a nossos aspectos instintivos negativamente, como convém aos padrões sociais. Em vez de seguirmos os passos do instinto mamífero em amamentar (olha a “sutileza” da redundância) a cria por longos períodos, optamos por ficar com o aspecto animalesco da amamentação. Vai entender…
Mitos, crendices e o terrível “no meu tempo era assim”
Nos mesmos mares turbulentos que navegam essas construções sociais, há mitos e a invencionice popular, que atuam como sentinelas da indústria da fórmula e afastam as mães da amamentação:
– O leite da mãe não é suficiente para saciar a fome do bebê.
– O leite da mãe fica “fraco” depois de alguns meses, que vira “água”.
– A fórmula infantil ajuda o bebê a dormir mais e, assim, deixar a mãe mais descansada e menos à disposição da criança até os seis meses de idade (quando o leite materno deve ser exclusivo na alimentação da criança).
– Há os que dizem, ainda, que criança morde o peito, que criança usa peito de chupeta e que criança que mama fica apegada com a mãe.
Em suma, eu até entendo, de certa maneira, por que há desconhecimento médico sobre como proceder com mulheres que amamentam. Afinal, em uma sociedade que faz desse ato natural algo tão cheio de melindres e impedimentos, é esperado que os profissionais reproduzam esse esquecimento em suas práticas cotidianas. Mas precisamos falar sobre isso, e achei que usar minha escrita para levar algumas pessoas a refletir e a agir poderia ser útil.
Tá amamentando? Tá difícil? Busque ajuda:
– Busque redes de apoio. Faça parte de grupos de mães no Facebook ou no WhatsApp. Partilhar é fundamental. Não assimile tudo que lê. Filtre aquilo que faz sentido para você. O resto você agradece e deixa aquela experiência/opinião voltar a quem de direito pelas forças do universo.
– Siga doulas, especialistas em amamentação, pediatras e outros especialistas assumidamente a favor da amamentação prolongada.
– Pesquise sobre criação com apego, comunicação não violenta e educação positiva.
– Consulte sempre: e-lactancia sempre.
– O Grupo Virtual de Amamentação (blog e Facebook) me salvaram em MUITOS momentos. Busque seguir, trocar experiências, se informar. Há um Grupo fechado no Facebook em que voluntárias ajudam mães com problemas para amamentar. Informação é a coisa mais preciosa que temos na vida e nos dá liberdade e coragem.
– Se der problema na amamentação, CORRA para um banco de leite. Duas dicas no Rio são: Instituto Fernandes Figueira (Tel.: 21 – 2554-1700 ), no Flamengo, e o Banco de Leite do Hospital Pedro Ernesto, Vila Isabel (Tel.: 21-2868-8208). A maioria das maternidades possui um banco de leite e pode ajudar mães com dificuldades na amamentação. Informe-se : )
Ah, se tiver dificuldades na amamentação, quiser ser ouvida, me escreve. Não sou especialista, mas tenho ouvidos para dar. Vamos juntas!
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