Sobre habilidades maternas e bônus X-Mãe

Ninguém se torna melhor só por ser mãe. Que fique claro, antes de qualquer coisa.

O que nos torna pessoas melhores, acredito eu, é a capacidade de permanecer abertos ao que nossas vivências têm a ensinar.

A maternidade é uma loucura experiência de profundas emoções, desafios, alegrias – e frustrações. Em um deslocamento metafísico, a gente se vê imersa em anos e anos de evolução e ancestralidade. Ficamos frente a frente com camadas e camadas de “existência humana” racional, sensorial e animal.

Ao mesmo tempo, cada mulher vivencia a maternidade de forma única, reflexiva, revisitando e ruminando as dores e alegrias do próprio nascimento, da própria história.

Em meio ao cenário, a gente aprende um tanto (todo dia, todo dia, todo santo dia, todo fucking dia, diga-se de passagem), e acaba por reavaliar todas as certezas a que nos apegamos ferozmente ao longo das nossas egoístas vidinhas. E desapegar é foda. Desapegar é difícil. Desapegar faz crescer. Crescer dói pra caralho, mermão. Mas a gente cresce. E se transforma.

Dito que ninguém é melhor por ser mãe, mas que pessoas costumam sair muito melhores após a experiência da maternidade, quero falar das habilidades que ganhamos com a chegada de um filho (o primeiro, ou os seguintes, acredito eu, porque essas habilidades devem se multiplicar de acordo com o número de melequentos amores em casa).

Algumas habilidades adquiridas com a maternidade são, de fato, comprovadas cientificamente. Outras, é a insubstituível observação empírica que avaliza.

No campo científico, estudos afirmam que o cérebro da mãe se expande para dar conta de todas as novas demandas da chegada de um recém-nascido. Assim como se aguça a sensibilidade da mulher, de modo que ela compreenda as não-faladas necessidades do bebê. Instinto animal, consciência racional, reações químicas, nosso corpo, espírito e todos os santos (que assim seja, amém) se unem para que a gente consiga preservar a espécie.

O bônus X-Mãe

Já no que diz respeito às habilidades curiosas e engraçadas, é como receber um bônus, que vamos chamar de bônus X-Mãe.

***E aqui, peço licença a nós mulheres para o humor. Na vida nua e crua, muitas “habilidades” atribuídas às mulheres e às mães não são uma escolha nada engraçada, mas, sim, impostas e reflexo de como uma sociedade machista e patriarcal nos sobrecarrega. A intenção não é fazer graça ou diminuir a nossa opressão, mas, sim, rir um pouco de situações que vivemos com a chegada dos filhos.***

Com a chegada de um filho, os nossos sentidos são lançados a uma potência sobrenatural, de modo que possamos defender a cria e sobreviver mais ou menos sãs (mentira, coisa nenhuma, sobreviver insanas mesmo). Veja só!

Ainda nas primeiras 24 horas após a chegada do rebento, ganhamos a capacidade de conseguir não dormir bem (às vezes não dormir at all) por meses – algumas mulheres por anos – e seguir vivendo.

Com o passar dos dias e a intimidade com o bebê, o nosso olfato fica SINISTRO: a gente sente um cheiro de bunda cagada a tipo uns três metros de distância, quando o primeiro centímetro da merda chega à atmosfera. E em frações de segundo.

Aliás, precisamos falar sobre cocô. Ninguém no mundo é capaz de celebrar uma cagada (literal) como as mães. Só quem é mãe sabe o desespero de um filho pequeno com prisão de ventre. E ninguém é capaz de ser tão especialista em cocô como uma mãe em busca da garantia e certeza de ter seu filho saudável pela análise da merda que vai na fralda. Cê acha nojento? Então, espera ser mãe rs.

Um boost nos é dado ao sexto sentido. Nada disso de sensibilidade aguçada, não. A gente fica é a Maga da Maternidade.

Aprendemos a ver o futuro. Mentira, não vemos o futuro, mas nos antecipamos de forma sobrenatural. Pensamos em possibilidades, prevemos necessidades, refazemos roteiros, avaliamos possíveis erros, fazemos rotas de fuga. Somos verdadeiras máquinas de solução.

Não existe maratona de dança no shopping (não fazem mais essas maratonas, fazem? Bom, quem é do tempo, lembra!) que supere a capacidade de uma mãe em balançar um filho para dormir. São horas, às vezes, várias vezes por dia, que resultam em braços dormentes e quilômetros de caminhadas pela casa. Para, no dia seguinte, ter mais maratona.

E a saliva para entoar todas as cantilenas que dão a trilha sonora dessas sonecas? Se eu fosse contabilizar quantas horas cantei para o meu filho (certamente, não só eu, mas eu e outras mães), ganharia por vezes consecutivas o Guiness.

E, mais: quando temos a criança dormindo em nossos braços, ao nosso lado ou em cima de nós (com um pé na nossa cara), somos capazes de não nos mexer por horas, dormindo ou acordadas… Tipo aqueles artistas de rua especialistas em performances de estátua humana.

Rapidez, elasticidade e multitasks são o nosso forte. Conseguimos limpar um nariz ranhento, falar ao telefone, enquanto temos a criança pendurada nas ancas, desviamos a mão do pequeno de um copo de vidro na pia e, ao mesmo tempo, e mexemos uma panela de comida.

Com o passar dos meses, aprimoramos esses superpoderes e adquirimos outros “dons”:

Os nossos beijinhos se tornam capazes de curar tudo: chulé, tosse, joelho ralado e galo na testa. Nosso colo e nosso abraço curam briga de rua, coração partido e até mau olhado.

Aprendemos práticas e técnicas infindáveis de storytelling nas mil e uma histórias que inventamos para tapear ou entreter a criança.

E descobrimos que uma pessoa é capaz de repetir a mesma frase por um número de vezes que levaria à loucura sem de fato enlouquecer, como: “Desce daí!”, “Cuidado!”, “Você vai cair!”, “Não brinca com a comida!”.

Desenvolvemos habilidades sinistras de negociação. Experimenta dissuadir uma criança quando cisma com alguma coisa. Meu filho está na fase de usar chinelos maiores do que o pé. Rouba dos adultos, dos primos. A avó paterna me saiu com uma ótima solução. Comprou para ele um chinelo uns quatro numeros maiores. Agora, ele dorme com o chinelo. E, aí, apresento outra habilidade materna: saber a hora de desistir.

Que mal tem a criança dormir com o chinelo LIMPO (a gente lava toda noite. Aliás, ele lava, porque toma banho com o chinelo rs)? Deixa dormir de chinelo, ninguém morre, ninguém chora, ninguém se estressa.

Desenvolvemos a arma secreta “poder de abstração”: mermão, se não oferece risco, não vai tacar fogo ou merda pela casa, não vai matar ninguém, nem ofender… Se é só uma baguncinha fora do roteiro ou uma forma inusitada em brincar com alguma coisa… Pode fazer. Depois, a gente resolve como arruma.

Adquirimos, ainda, técnicas sofisticadas de investigação…

E praticamos métodos refinados de interrogatório, que se adaptam de acordo com a idade da criança.

Ainda, comandamos chuvas e ventos. Experimente nos contrariar quando avisamos que é pra levar guarda-chuva, que vai chover, ou um casaco, porque vai esfriar. Chove. E faz frio.

Nós somos. Nós somos tudo ❤ Mães ❤

E você, qual a sua habilidade X-Mãe? ❤

Foto da postagem: Lewis Roberts no Unsplash